Carta enviada a Pedro Passos Coelho - ainda sem resposta
Exmo Senhor
Primeiro-Ministro de Portugal
Doutor Pedro Passos
Coelho:
Sou antiga aluna do Instituto de Odivelas, a melhor escola pública nacional
que tive o privilégio de frequentar como orfã de um oficial da Marinha de
Guerra Portuguesa. Não fosse a existência desta notável instituição de acção
social, não teria tido possibilidades de receber a educação de excelência e a
formação de carácter que contribuíram para desenvolver plenamente as minhas
capacidades como pessoa e como mulher independente.
O Instituto de Odivelas ocupa anualmente os lugares cimeiros dos “rankings”
nacionais e forma raparigas provenientes dos mais diversificados estratos
sociais, raças e credos, que marcaram e marcam a Sociedade. Ali foram formadas
mulheres como Luna Andermatt (fundadora da Companhia Nacional de Bailado), Rosa
Lobato de Faria (actriz, escritora e compositora), Ana Paula Padrão (actriz), Isabel
Maria Gago (primeira mulher formada em Engenharia Química), Paula Costa (primeira
mulher piloto militar da Força Aérea), Maria Isabel Joglar (primeira mulher na
modalidade olímpica de Tiro de Pistola), Maria João Rolo Duarte (primeira
mulher jornalista a assinar reportagens desportivas), Julieta Espírito Santo (primeira
médica São-Tomense), Ana Maria Lobo (primeira presidente e co-fundadora da AMONET
- Associação Portuguesa de Mulheres Cientistas), Teresa Leal Coelho (deputada) e
mães de figuras públicas conhecidas como Marcelo Rebelo de Sousa, Nuno Rogeiro
ou o pianista Artur Pizarro, entre outros. Também por lá passaram professoras
de renome como Adelaide Cabete (médica), Maria José Estanco (primeira
arquitecta portuguesa), Olga Violante (primeira Directora do Coro de Câmara da
Gulbenkian).
Foi pois com estupefacção que tomei conhecimento em 2012 do plano do Sr.
Ministro da Defesa Nacional para extinguir o Instituto de Odivelas alegadamente
para poupança de custos. De imediato lancei uma petição pedindo a continuidade
do Instituto de Odivelas como uma escola de excelência. Não consegui até agora
os resultados pretendidos, embora das várias reuniões tidas com os Grupos
Parlamentares tenha a percepção de que a maior parte dos Deputados não concorda
com a decisão do Sr. Ministro da Defesa Nacional. Infelizmente a morosidade dos
tribunais, dos processos administrativos e dos processos parlamentares fez com
que até agora não tenha sido possível travar o processo de extinção que se
afigura inexplicável e lesivo do Interesse Nacional.
Na realidade, o argumento inicial da poupança de custos já foi liminarmente
afastado pois o Instituto de Odivelas forma alunas com um custo inferior ao de
qualquer escola pública nacional sem regime de internato e, se em 2013 se podia
tornar sustentável com o pagamento de uma mensalidade adicional, em 2014,
graças ao aumento do número de alunas e redução de custos decorrente de uma
gestão racionalizada, é já sustentável sem necessidade dessa mensalidade extra.
Estes custos incluem as verbas imprescindíveis para a manutenção da parte
histórica do Mosteiro. Este argumento torna-se ainda menos compreensível quando
o Sr. Ministro da Defesa Nacional escreve aos Pais das alunas dizendo que vai
continuar a investir milhões de euros nos estabelecimentos militares de ensino.
Acresce que a Associação de Pais (APEEAIO) e a Associação das Antigas
Alunas (AAAIO) apresentaram propostas adicionais de racionalização e aumento de
receita que foram ignoradas pelo Sr. Ministro da Defesa Nacional.
Ao contrário das alegações de extinção de discriminação de género feitas
pela Srª Secretária de Estado Adjunta da Defesa, Drª Berta Cabral, a situação
criada pelo Sr. Ministro da Defesa Nacional em torno do Instituto de Odivelas
configura uma clara discriminação de género contra as alunas desta escola, ao
serem elas e só elas privadas da sua escola, privadas de internato, privadas de
uma oportunidade de educação de excelência e obrigadas a sofrer diariamente
deslocações para e do Colégio Militar, privando-as dos períodos de estudo que
serão passados nos transportes na Calçada de Carriche nas horas de ponta.
Acresce que o Estado Português reconhece e financia o ensino diferenciado
particular, o que significa que reconhece o direito à escolha entre coeducação
e ensino diferenciado, não podendo por isso aniquilar a única escola pública
feminina.
Não há portanto razões conhecidas que sejam claras, objectivas, lógicas e
justificáveis para o encerramento do Instituto de Odivelas, estando excluídas
as de poupança ou melhoria de condições de ensino como se demonstrou. Não há
também o acordo quanto ao encerramento de nenhuma das partes envolvidas
(alunas, pais e encarregados de educação, professores e outros funcionários,
antigas alunas, alunos e antigos alunos das outras escolas congéneres no país e
no estrangeiro, chefias militares, deputados e figuras de relevo da sociedade
portuguesa). Só o Sr. Ministro da Defesa Nacional persiste em não querer ouvir
as partes e recusar esclarecer os verdadeiros motivos subjacentes a esta
obstinação.
Por isso têm surgido os mais variados rumores sobre as verdadeiras razões
que estão subjacentes ao pretendido encerramento do Instituto de Odivelas e que
vão desde interesses que envolvem a Câmara Municipal de Odivelas, o Grupo
Pedago (Instituto Superior de Ciências Educativas da Ramada, Odivelas), o Grupo
Lusófona (Departamento de Turismo), Universidade Católica, Grupo Laureate
International Universities (Universidade Europeia, ex-ISLA) e Grupo Pestana,
Associação Turismo de Lisboa, enfim, um sem número de possibilidades e
especulações ligadas a interesses imobiliários, incendiados por visitas de
pessoas ligadas à Universidade Católica ao Forte de Santo António do Estoril, a
colónia de férias das alunas do Instituto de Odivelas.
Senhor Primeiro-Ministro, como pessoa de bem e o garante da democracia
nacional, não quero acreditar que possa estar de acordo com esta decisão do Sr.
Ministro da Defesa Nacional, a não ser por não estar na posse de todos os
dados. Pelo exposto, venho respeitosamente solicitar a V. Exª que se debruce
sobre a proposta de extinção do Instituto de Odivelas.
Faculto agora alguns dos documentos que considero mais pertinentes para que
possa ajuizar e, espero, travar a extinção de uma escola de excelência com 114
anos de existência, que poderia bem servir como modelo para outras escolas
públicas em Portugal.
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